quinta-feira, julho 24

A VERDADEIRA IDENTIDADE DE FLORINDINHA

Capítulo I
Zé da Horta e Chica Ranheta já tinham seis filhos, mas, aprochegando-se o nascimento do sétimo rebento, havia uma certa borrasca no lar. As seis tentativas anteriores não foram suficientes para realizar o sonho do homem: ser pai de uma menina.
Caseiro na Herdade do Adriano Vesgo, Zé era um tipo casmurro, marcado pela porrada que levou dos quatro irmãos mais velhos, patifes arruaceiros cujo grande divertimento, quando estavam em casa, era cascar no benjamim. Facto que o fazia detestar os filhos machos.
Zé da Horta vivia como um touro prestes a investir. Ao mínimo pretexto, distribuía estalada pela meia-dúzia de catraios ranhosos. Por isso Chica Ranheta nem se espantou quando o marido, com um tom de voz até doce se comparado ao tratamento habitual que dispensava à família, decretou:
- Se for outra “menina de três pernas”, afogo os dois no tanque da horta, sua cadela!
Para sorte da pobre mulher, Zé estava no trabalho quando ela entrou em trabalho de parto. Ao conferir, com a criança ainda nas mãos da comadre que a assistiu, que se tratava de “uma menina com rastilho”, Chica chorou baba e ranho. A comadre Jacinta, a velha parteira, tentou consolá-la com as palavras simples mas sábias de quem estava habituada áqueles cheliqes:
- Dêcha-te disso cachopa. Atão o qu’é que deu agora…, tu sempre foste rija. Pariste outros seis sem te pores pr’aí a berrar. Isso até te fica mal. Limpa-me essas ventas, vá.
- Nã é isso, Ti Jacinta... - interrompeu a mulher, entre lágrimas - o problema é que o meu Zé vai me matar se souber que é outro cachopo…
Ti Jacinta era uma mulher manhosa. Com um sorriso maroto, sugeriu:
- S’é assim, cria o cachopo como se fosse uma menina. O compadre Zéi neim vai pôr reparo...
- A comadre acha que isso pode dar certo? - animou-se Chica Ranheta.
- Atão nã haverá de dar rapariga... Lembras-te daquela moçoila que vivia com o porqueiro da herdade do Tojal? Tinha aqueles pêlos todos porque era homem. Oh filha é o que há mais…
Agarrando-se aquele fio de esperança, a mãe abraçou carinhosamente a criança e encheu-se de ternura.
- E... pode dar certo. Ate que ele parece uma flor, tão lindo...
- Uma flor, linda, filha... - corrigiu Jacinta – Florinda…
- Florinda Ranheta da Horta, Florindinha.

(Conseguirá Chica Ranheta passar a perna ao seu homem? Nem eu sei. Não perca o próximo capítulo, se houver…)

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